Quando se fala em “arte islâmica”, não significa, necessariamente, uma manifestação artística que tenha por finalidade render o culto à fé. Na verdade, este termo refere-se à unidade criativa de uma arte e arquitetura características de uma civilização que dominou grande parte do mundo durante muito tempo.
Tão pouco se limita a uma única etnia e sim a diversas, que abrange regiões tão diversas como grande parte da África, o Magrebe, a Indonésia, o Golfo Pérsico e algumas regiões do Cáucaso, da Europa, da China e Índia. Sob o signo da autêntica identidade supranacional, existem muitas diversidades culturais que tomaram formas locais e regionais.
No primórdios do Islam, surgiu, de imediato, uma arte rica e variada, baseada na tradição clássica, na arte bizantina, na persa e na dos povos orientais subjugados. Não obstante, a originalidade das estruturas arquitetônicas e os motivos ornamentais deram, como resultado, uma arte característica, tipicamente muçulmana.
Em todas as criações artísticas islâmicas percebe-se uma indiscutível unidade e uma expressão comum. A ornamentação é, sem dúvida, um dos aspectos que mais contribuíram para a unificação da arte islâmica. Os mesmos temas de decoração surgem na arquitetura com independência de material, escala ou técnica utilizada.
A grande profusão de superfícies decoradas faz com que as estruturas permaneçam parcialmente camufladas. Através da repetição dos motivos, de um modo geral geométricos, e a sábia combinação de materiais e texturas, consegue-se um efeito tridimensional, que dá às construções um certo ar de mistério.
A luz e a água são elementos indispensáveis para se alcançar esse efeito quase irreal. Tanto nos edifícios como nos objetos decorativos, a caligrafia, os motivos de estrelas entrelaçadas e os motivos vegetais estilizados, também conferem aos espaços uma inter-relação harmoniosa.
De um modo geral, os motivos figurativos aparecem nos objetos domésticos, contrariando a crença popular de que a tradição muçulmana os proíbe. É bem verdade que, se não os proíbe, pelo menos desaconselha, uma vez que a divindade perderia seu caráter transcendental e imaterial ao tentar ser representada.
Por este motivo, as figuras humanas nunca são encontradas nas mesquitas muçulmanas. Entre as artes decorativas hispano-muçulmanas, merecem destaque os arcos, os entalhes, o uso do bronze, os objetos de madeira, a cerâmica vidrada, as pias para as abluções, os tecidos em seda bordada e os livros ricamente encadernados e com iluminuras.
Em relação à arquitetura, são numerosos os edifícios hispano-muçulmanos que ainda podem ser vistos e admirados na Espanha. Entre os de caráter religioso, estão as mesquitas. No início, elas se basearam na casa do Profeta Muhammad ﷺ, que apresentava um espaço reservado e fechado e outro a céu aberto. Esse esquema simples foi evoluindo até converter-se num organismo perfeitamente funcional e adequado para as orações da comunidade.
Na Andaluzia quase todas as mesquitas apresentam a indicação da direção da qibla (Makkah), onde há um mihrab, de onde o imam dirige a oração. Todas possuem minaretes, de onde é feita a convocação para as cinco orações do dia (adhan). Outro elemento característico é o pátio, onde se encontram a fonte para as abluções. A parte coberta da mesquita, chamada haram, compõe-se de uma grande sala, com naves perpendiculares à qibla.
Entre as maiores mesquitas de Andaluzia, sobressai-se a de Córdoba. A grande mesquita de Córdoba mereceria um capítulo à parte. Ela foi mandada construir por Abdul Rahman I, em 780, que queria uma mesquita como as do califado de Damasco, onde sua dinastia tinha sido abolida pelos abássidas.
Assim, ele decidiu construir a maior mesquita do mundo sobre o que tinha sido a igreja visigoda de São Vicente. A atual mesquita ocupa 23.400 m2, com quase quinhentos arcos e colunas que se sobrepõem, que foram sendo construídos pelos sucessores de Abdul Rahman. É considerada um dos monumentos supremos da arte islâmica e o fantástico bosque de colunas e arcos de seu interior é um dos espaços de oração mais belos que já se construiu.
Poucas obras de arte desta magnitude apresentam uma confluência artística como a mesquita de Córdoba, onde aparecem justapostos o estilo califal, a influência bizantina e do Oriente Médio e os elementos e influências visigodas e hispano-românicas. Este grande templo muçulmano mostra toda a sua magnificência por onde quer se olhe. Bastam como exemplos, a cúpula octogonal central, ricamente decorada com mosaicos policrômicos e dezenas de detalhes singulares que arrematam o conjunto.
O mihrab possui uma decoração deslumbrante, com mármores lavrados com mosaico bizantino. Outra construção característica do mundo islâmico é a madrassa, lugar destinado ao ensino das ciências religiosas e da jurisprudência. Antigamente, eram dispostas em torno de um pátio para o qual davam quatro grandes salas e as acomodações dos estudantes.
Em Granada ainda existe uma dessas madrassas, mas as mais espetaculares são as madrassas construídas pelos Marinidas em Fez, principalmente a de Bu Inania. No campo da arquitetura militar, cabe citar a fortificação das cidades, com muralhas que apresentavam guaritas em espaços regulares. Quanto à arquitetura residencial, destacam-se também os palácios e alcazares, alguns tão suntuosos como o de Alhambra e o Madinat al-Zahra, um autêntico palácio-cidade.
Outra característica da arquitetura hispano-muçulmana é a grande quantidade de salas de banhos e banheiros (hammam), essenciais para a higiene que o Islam tanto preza. Inspirados nas termas antigas, estão integrados por vários espaços onde a temperatura vai aumentando aos poucos. O ar se distribui subterraneamente e é aquecido por grandes caldeiras. Ronda e Jaén dispõem de magníficos exemplos.
A Grande Mesquita de Córdoba
Durante os trinta e três anos do seu Reinado, Abdrahman fez de Córdoba a sua Capital. Em 785, planejou a construção da Mesquita, que se tornou (dois séculos mais tarde e com várias implicações) uma das obras-primas da arquitetura Islâmica clássica. Na sua primeira versão, este edifício quadrado de 70 metros de lado (que abrange cerca de 500 metros quadrados) era constituído por um átrio oblongo (segundo a tradição Islâmica), antecedido por um pátio, também mais largo do que comprido. A sala hipóstila tinha onze naves com arcadas perpendiculares ao Qibla (lugar para onde os muçulmanos se viram quando fazem as orações).
O espaço divide-se em doze vãos assentes em 110 colunas, provenientes de edifícios visigóticos ou de outros mais antigos. Tal como em Damasco, a reutilização de materiais de construção ajudou a ditar a edificação desta Mesquita, na qual as colunas de mármore e os capitéis foram recuperados de antigas cidades devastadas durante as grandes invasões. A fachada do pátio, sustentada por pilares maciços, abria-se em vãos, permitindo que a luz entrasse na sala de Oração, coberta por um teto de madeira.
Nos reinados de Hisham (788-796) e de Al-Hakam (796-822), a Mesquita de Córdoba não sofreu alterações. Só com a chegada do Amir Abdrahman II (822-852) é que as primeiras obras de ampliação fizeram subir para 200 o número de colunas da sala hipóstila. Durante o período de construção, entre 832 e 848, a superfície duplicou e o Qibla foi deslocado para Sudeste, pois o edifício tinha de estar virado para Kaaba, mas o número de naves não se alterou.
Oitenta anos depois, Abdrahman III (912-961), que se autoproclamou Califa em 929, levou a cabo uma segunda ronda de ampliações. Mandou ampliar o átrio para Sudeste e colocar um minarete quadrado, com 34 metros de altura, no extremo do pátio. Alguns anos depois, Al-Hakam (961-976) fez outras alterações, conferindo ao monumento o seu aspecto definitivo. O recinto de Oração deixou de ser oblongo para se projetar no sentido do comprimento, ainda com 79 metros de largura, mas com 115 metros de comprimento e 320 colunas.
Estes trinta e dois vãos e o “mihrab” (lugar de onde o se profere as palestras), em forma de sala octogonal antecedida por três cúpulas com abóbodas de nervuras intersectadas, que por sua vez eram bordejadas por arcadas multilobadas, devolveram à Mesquita de Córdoba o seu aspecto original.
Decoração Suntuosa e Exuberante
A decoração da Mesquita de Córdoba foi obra do Califa Al-Hakam II, sobretudo na zona do Mihrab e do maqsura que o rodeavam. Em muitos aspectos, a decoração deste recinto de Oração arrastou as tradições de Jerusalém e de Damasco; há uma continuidade que é visível no estilo Omíada. No entanto, importa recordar que 150 anos separaram as duas criações do Próximo Oriente e a obra Andaluza na sua versão final.
O maravilhoso Palácio de Alhambra, situado em uma encosta em Granada, é o Palácio da Andaluzia mais bem conservado. Embora tivesse sido começado em 1230, só dois séculos depois ficou concluído. A Alhambra (em espanhol: الحمراء; “a Vermelha”) trata-se de um rico complexo palaciano e fortaleza (alcazar ou al-Ksar) que alojava o emir da Dinastia Nasrida e a corte do Reino de Granada.
O seu verdadeiro atrativo, como em outras obras muçulmanas da época, são os interiores, cuja decoração está no cume da arte islâmica. Esta importante atração turística espanhola exibe os mais famosos elementos da arquitetura islâmica no país. A Alhambra é uma cidade amuralhada (medina) que ocupa a maior parte da colina de La Sabika.
A cidade de Granada tinha o seu próprio sistema de muralhas, pelo que a Alhambra podia funcionar de forma autônoma em relação a Granada. Na Alhambra encontravam-se todos os serviços próprios e necessários para a população que ali vivia: palácio real, mesquitas, escolas, oficinas, etc. O seu elemento mais ocidental é a alcáçova (cidadela); uma posição fortemente fortificada.
O resto do planalto compreende vários palácios, cercados por uma muralha defensiva, flanqueada por 13 torres, algumas defensivas e outras destinadas a providenciar vistas panorâmicas para os seus habitantes. O rio Darro corre ao longo de uma profunda ravina a norte e divide o planalto do bairro de Albaicín. Do mesmo modo, o vale Assabica, onde está inserido o parque de Alhambra a oeste e a sul, e, por trás deste vale, a quase paralela cadeia do Monte Mauror, separa o complexo do bairro de Antequeruela.
A Construção de Alhambra
A maior parte do complexo foi construído, principalmente, entre 1248 e 1354, nos reinados de Ibn-al-Ahmar e dos seus sucessores; a Alhambra é um reflexo da cultura dos últimos anos do reino nasrida, sendo um local onde os artistas e intelectuais procuravam refúgio no decurso das vitórias cristãs por todo o Al Andaluz. Mistura elementos naturais com outros feitos pela mão do homem, sendo um testemunho da habilidade dos artesãos muçulmanos da época.
Muhammad ibn Nasr, chamado Al-Hamar (o vermelho) por ter a barba ruiva, o fundador da Dinastia Nasrida, iniciou a construção de Alhambra preparando-a para a residência de um rei. De acordo com um manuscrito árabe publicado como o Anonimo de Granada y Copenhague, “Este ano 1238 Abdallah ibn al-Ahmar escalou ao lugar chamado “a Alhambra” inspecionou-o, definiu a fundação de um castelo e deixou alguns encarregados para a sua construção (…)”.
O desenho incluía planos para seis palácios, cinco dos quais agrupados no quadrante nordeste formando um quarteirão real, duas torres circulares e numerosos banhos. Durante o domínio da Dinastia Nasrida, a Alhambra foi transformada numa cidade palaciana, completada com um sistema de irrigação composto por canais para os jardins da Generalife, uma vila localizada no exterior da fortaleza.
Previamente, a velha estrutura da Alhambra estava dependente da água da chuva recolhida para uma cisterna e daquela que podia ser trazida do Albaicín. A criação do Canal do Sultão solidificou a identidade da Alhambra como uma cidade-palácio, em vez de uma estrutura defensiva e ascética.
O estilo granadino na Alhambra é o culminar da arte andaluza, o que ocorreu em meados do século XIV durante os reinados de Yusuf I (1333-1354) e Muhammad V (1354-1391). Os esplêndidos arabescos do interior estão relacionados, entre outros emires, com Yusef I, Muhammad V, Ismail I, etc.
O domínio muçulmano de Granada chegou ao fim em 1492, quando os nasridas foram derrotados pelo Rei Fernando II de Aragão e pela Rainha Isabela de Castela, os quais tomaram a região envolvente de uma forma esmagadora. Depois dessa data, os conquistadores começaram a alterar o complexo arquitetônico, com os Reis Católicos a fazerem da Alhambra um palácio real.
Os trabalhos inacabados foram cobertos de cal, apagaram-se as pinturas e dourados, o mobiliário foi destruído ou levado para outros locais. Carlos V (1516–1556) reconstruiu partes do complexo no estilo renascença, contemporâneo, destruindo grande parte do palácio de Inverno para dar espaço a uma estrutura, também em estilo Renascença, que nunca chegou a ser concluída. Filipe V (1700–1746) modificou os quartos para um estilo mais italano completou o seu palacete mesmo no centro do que fora o edifício mourisco.
Erigiu determinadas partes que esconderam por completo algumas estruturas originais. Em anos subsequentes, sob as autoridades espanholas, a arte islâmica continuou a ser desfigurada. Em 1812, algumas das torres foram demolidas pelos franceses, comandados pelo Conde Sebastiani. O resto do edifício escapou por pouco – aliás, era essa a intenção inicial de Napoleão.
Em 1821, um terremoto causou mais estragos. O trabalho de restauro, começado em 1828, da responsabilidade do arquiteto José Contreras, foi patrocinado em 1830 por Fernando VII. Depois da morte de Contreras, em 1847, foi continuado, com franco sucesso, pelo seu filho Rafael (morreu em 1890), e pelo seu neto Mariano.
O Comité do Património Mundial da UNESCO declarou a Alhambra e o Generalife de Granada como Património Cultural da Humanidade na sua sessão do dia 2 de Novembro de 1984 e, cinco anos depois, o bairro de El Albaicín (Al Albayzín), antiga cidade medieval muçulmana, obteve a mesma denominação como extensão da declaração de Patrimônio Cultural da Humanidade de La Alhambra e do Generalife.
Medina Zahara
Medina Al-Azahra que significa “a cidade de Zahra”, era uma cidade palaciana localizada a cerca de 5 km de Córdoba. A sua construção começou no ano de 936 d.C. a mando de Abdrahman III, primeiro califa do Al-Andalus, e os principais motivos da sua construção foram de índole político-ideológica: a dignidade do califa exige a fundação de uma nova cidade, símbolo do seu poder político. Outro motivo apontado foi a construção da medina em honra da mulher de Abdrahman III, Al Zahra.
Viria a ser destruída e saqueada em 1010 por ocasião da fitna que levaria ao colapso do Califado. Este ataque riscaria a cidade do mapa durante quase um milénio. As obras começaram em 936, a cargo do mestre alarife Maslama ben Abdallah.
Em 945 ocorreu o translado da corte a esta cidade, que nesses momentos conta com a mesquita Aljama (941), embora a casa da moeda não se transladasse até 947-948. Porém, as obras prolongaram-se até o reinado de Alhakam II, o que explica as similaridades estilísticas entre esta cidade e a ampliação da mesquita de Córdoba, levadas a cabo por este filho e sucessor de Al-Nasir.
Situa-se na Sierra Morena, ao pé da montanha Yebel al-Arus (‘monte da Desposada’) e em contato com o vale do Guadalquivir. A topografia em ladeira deste lugar explica a sua disposição em terraços ou níveis, o primeiro dos quais corresponde à zona residencial do califa, seguido pela zona oficial (casa dos vizires, corpo de guarda, salão rico, dependências administrativas, jardins…) para finalmente albergar a cidade propriamente dita (moradias, artesãos…) e a mesquita Aljama, separadas dos dois terraços anteriores por outra muralha específica para isolar o conjunto palaciano.
Medina Azahara apresenta uma planta retangular de aproximadamente 1500 metros por 750, com traçado ortogonal e uma rede de esgoto e abastecimento de água perfeitamente planejada. É considerada a maior superfície urbana construída de uma vez no Mediterrâneo.
Atualmente só se tem escavado cerca de 10% da sua superfície total, entre a que se destaca o salão rico ou salão de Abdrahman III, usado para a recepção de embaixadores importantes, bem como para celebrar as festas anuais de final do jejum e dos sacrifícios, que ocorreram em Medina Azahra de 971 a 976.
O salão Rico foi construído entre 953 e 957 por Abdrahman III, como testemunham as inscrições epigráficas aparecidas nas pilastras no seu interior; tem planta basilical de três naves longitudinais com outra transversal na sua entrada que age de pórtico.
Este salão está decorado com relevos de ataurique em mármore nos seus rodapés, seguido por relevos de diferentes motivos até a típica coberta de artesoado de madeira. As colunas alternam os fustes de mármore rosa e azul, terminados por cimácios e os típicos capitéis de vespeiro califais, desde os que arrancam os característicos arcos de ferradura, nos quais se dá a alternância de aduelas; é aqui onde se formalizam as características do arco de ferradura califal, onde o alfiz aparece como envoltório protetor do próprio arco.
Sobre estes apoia-se o friso corrido em contato com o cobrimento de madeira. Destaca-se de todo o conjunto uma série de tabuleiros, cujo tema único é a árvore da vida. Constitui a peça mestra do conjunto arquitetônico que inclui o Jardim Alto. Ambos, o salão e jardim, fazem parte de uma mesma concepção com forte simbolismo religioso e político, que tem por objeto a magnificação do califa.
A oriente do salão, e ligados com o mesmo, foram construídos um conjunto de cômodos pavimentados em mármore branco, bem como o chamado “pátio da pia”, que faz parte das estâncias prévias a um banho de reduzidas proporções. A sala de cinco naves da Casa dos Vizires abre-se para uma larga e elevada calçada, da que baixam umas escadas para uma gigantesca praça quadrada, atualmente adaptada como jardim.
Sobre a função deste edifício há diferentes opiniões. Durante muito tempo foi chamado “a Casa do Exército” pois as medidas da sala e da explanada parecem aludir a funções representativas. Contudo, atualmente acredita-se que o edifício estava a disposição do pessoal encarregue da administração.
A medina esteve cercada por uma grossa muralha, que constitui mais um limite que um dispositivo militar estritamente defensivo. Somente foi escavado o trecho central da muralha norte, construída com silhares de pedra calcária, como toda a cidade. Para o exterior é reforçada com torres retangulares e no interior apresenta contrafortes como reforço estrutural, para conter o empuxo das terras da ladeira.
No centro desta muralha norte uma porta onde existia um caminho que ligava Medina Azahra com Córdoba. Este acesso norte ao Alcázar apresenta uma disposição acotovelada, quebrada, que responde ao tipo de “portas em cotovelo” usadas na arquitetura militar islâmica. O que atualmente se observa corresponde à restauração realizada durante a década de 1930 por Félix Hernández, pois quase a totalidade da estrutura original desapareceu devido às espoliações sofridas nos muros.
Mesquita Aljama
No terraço inferior situa-se a mesquita aljama. De planta retangular, aparece orientada para sudeste e os seus elementos básicos (pátio, sala de oração e minarete) organizam-se segundo o esquema característico do ocidente islâmico. A sala de oração é de planta basilical, com cinco naves separadas por arcarias de ferradura.
A noroeste ergue-se o minarete, de planta quadrada no exterior mas octogonal no interior.No lateral oriental do Jardim Alto, um passadiço coberto (sabat) permitia o califa deslocar-se para o interior, salvando o desnível da rua com uma ponte da que apenas restam os seus baseamentos; assim penetrava na mesquita através da dupla quibla que dava à maqsura, construída com barro cozido. O restante do solo da sala de oração estava coberto com esteiras de esparto, alguns de cujos vestígios apareceram na escavação.
O exterior da mesquita apresentaria muros lisos com contrafortes coroados por ameias dentadas, centrando-se a sua decoração nas portas. Construíram-se uma série de cômodos frente à fachada principal da mesquita, que pela distribuição e local, podem ser identificados como uma casa de esmola (dar al-sadaka).
Apesar da riqueza e solidez dos materiais empregados, Medina Azahara não chegou a sobreviver nem um século após a sua construção, pois foi demolida e saqueada em 1010, como consequência da guerra civil (ou fitna) que pôs fim ao califado de Córdoba. Seu saque e desmantelamento prosseguiu nos séculos sucessivos, pois foi usada como “canteira artificial” para a construção de outras edificações posteriores na cidade de Córdoba.
Um dos objetos mais importantes encontrados foi a caixa de marfim com inscrições chamada de Píxide de Al-Mughira, que é conservada no museu do Louvre.As escavações oficiais começaram em 1911, e seguiram sem interrupção desde então. O arquiteto Félix Hernández Giménez foi o investigador que escavou a parte central do Alcázar (uma superfície de 10,5 hectares), bem como foi restaurado o salão de Abdrahman III.
Em abril de 2007 começaram, pela primeira vez, escavações no exterior da zona do Alcázar, com o fim de documentar o traçado da muralha sul da cidade, bem como de localizar alguma das portas secundárias e estruturas intramuros e correspondentes aos arrabais.
O objetivo último desta escavação é possibilitar num futuro um itinerário de visita que transcorra, desde o novo centro de visitantes a sudeste do sítio arqueológico, através dos caminhos originais da cidade palatina. Entre as descobertas mais imediatas desta nova campanha destacam-se as fossas de espoliação da muralha, bem como uma mesquita.
Palácio da Aljafería
A Aljafería é um palácio fortificado construído na segunda metade do século XI, na época de Al-Muqtadir, em Zaragoza, como residência dos reis e reflete o esplendor alcançado pelo reino taifa de Saraqusta no momento de seu máximo apogeu político e cultural.
Sua importância reside no fato de que é o único testemunho conservado de um grande edifício da arquitetura islâmica espanhola da época das Taifas. De modo que, se conserva um magnífico exemplo do Califado de Córdoba, sua Mesquita (século X), e outro do “canto do cisne” da cultura islâmica, La Alhambra de Granada, esta já do século XIV, deve-se incluir na tríade da arquitetura hispano-muçulmana a Aljaferia de Zaragoza (século XI) para conhecer as realizações da arte taifa dessa época intermédia de reinos independentes anterior à chegada dos almorávidas.
A construção do palácio foi ordenada por al-Muqtadir, segundo monarca da dinastia dos Banu Hud, como símbolo do poder alcançado pela Taifa de Zaragoza na segunda metade do século XI. O rei em pessoa chamou ao seu palácio de “Qasr al-Surur” (Palácio da Alegria) e a sala do trono onde presidia as recepções e embaixadas de “Maylis al-Dahab” (Salão Dourado).
O nome Aljaferia é documentado pela primeira vez num texto de al-Jazzar as-Saraqusti (entre 1085 e 1100) e outro de Ibn Idari de 1109, como derivação do prenome de al-Muqtadir, Abu Ja’far, e de «Ja’far», «al-Jafariyya», que evoluiu para «Aliafaria» e daí a «Aljaferia».
Depois da reconquista de Zaragoza em 1118 por Afonso I, O Guerreiro passou a ser residência dos reis cristãos de Aragão, com o que a Aljaferia se converteu no principal foco difusor do mudéjar aragonês. Foi utilizada como residência régia por Pedro IV, o Cerimonioso e posteriormente, na planta principal, foi efetuada uma reforma que converteu estas estâncias em palácio dos Reis Católicos em 1492.
Em 1593 experimentou outra reforma que a converteria em fortaleza militar, primeiro segundo desenhos renascentistas (que hoje se podem observar no seu entorno, fosso e jardins) e mais tarde como aquartelamento de regimentos militares. Sofreu reformas contínuas, e grandes danos, sobretudo com os Sítios de Zaragoza da Guerra da Independência Espanhola até que finalmente foi restaurada na segunda metade do século XX e atualmente acolhe as Cortes de Aragão.
Abdrahman III
O Abdrahman III, foi o oitavo Emir de Córdoba (912 – 929) e, depois, o primeiro califa do Al-Andaluz (de 929 a 961). É considerado o maior e mais bem sucedido dos príncipes da dinastia omíada na península Ibérica. Ascendeu ao trono apenas com vinte e dois anos e reinou cerca de meio século.
A sua vida está de tal forma identificada com o governo do seu estado que acabamos por ter mais material biográfico sobre o seu antecessor Abdrahman I, que sobre si, inegavelmente mais importante no plano histórico. Era neto de Abdallah, outro grande líder hispânico dos omíadas, a quem sucedeu.
Abdrahman III conseguiu fazer face a todos os seus adversários, foi conhecido pela sua tolerância para com a comunidade cristã e judaica. Ao declarar-se o Califado de Córdoba estava quebrando, efetivamente, todos os laços que o uniam aos Califas Egípcios e Sírios. Os seus ascendentes tinham-se contentado apenas com o título de emir (príncipe).
Na altura, era aceito que apenas o governante das cidades santas de Makkah e Madina poderiam reclamar tal título. A força da tradição estava, contudo, muito esbatida, de modo que Abdrahman III fez-se proclamar sucessor do Profeta (califa) e príncipe dos crentes (amir al-Mu’minin) a 16 de Janeiro de 929, ganhando um prestígio sem precedentes para um líder muçulmano na Europa, tanto entre os seus súditos hispânicos como na África, foi nessa data que assumiu a sua al-kunya an-Nasir li-Din Allah.
A sua principal missão, foi a unificação de al-Andaluz, conquistou Osma, de San Esteban de Gormaz. Em resposta aos ataques do rei de Leão Ordonho II, venceu os reis de Leão e Navarra, na Batalha de Valdejunquerra, a 26 de Julho de 920.O Califado de Córdoba entrou numa época de grande prosperidade econômica e prestígio mundial. É disso exemplo a quantidade de moedas de ouro e de prata cunhadas por Abdrahman III.
O conjunto de obras públicas e medidas administrativas foram também muito elogiadas ao longo da história. Os povos mais distantes da época fizeram-lhe homenagens por diversas vezes. Foi o fundador da escola de medicina de Córdoba. Abdrahman III, morreu na Medina Al-Zahra aos 70 anos, após um reinado de 50 anos e meio.
O corpo foi transladado para o Alcácer de Córdoba, onde foi enterrado. Abdrahman III não somente fez de Córdoba o centro nevrálgico de um novo império muçulmano no Ocidente, mas converteu-a na principal cidade da Europa Ocidental, rivalizando ao longo de um século com Bagdá e Constantinopla (capitais do Califado Abássida e do Império Bizantino, respectivamente) em poder, prestígio, esplendor e cultura. Sob o seu governo, a cidade alcançou o milhão de habitantes, que dispunham de mil e seiscentas mesquitas, trezentas mil moradias, oitenta mil lojas e inúmeros banhos públicos.
Este califa omíada foi também um grande impulsionador da cultura: dotou Córdoba com cerca de setenta bibliotecas, fundou uma universidade, uma escola de medicina e outra de tradutores do grego e do hebraico para o árabe. Fez a ampliação da Mesquita de Córdoba, reconstruindo as ameias, e mandou construir a extraordinária cidade palaciana de Madinat al-Zahra, na qual residiu até à morte.
O aspecto do desenvolvimento cultural não é menos relevante com a chegada ao poder do califa al-Hakam II, a quem é atribuída a fundação de uma biblioteca que teria atingido os 400 000 volumes. Talvez isso provocou a ascensão de postulados da filosofia clássica -tanto grega quanto latina- por parte de intelectuais da época como foram Ibn Masarra, Ibn Tufail, Averróis e o judeu Maimônides, embora os pensadores de Al-Andalus se destacassem, sobretudo, em medicina, matemáticas e astronomia.
Andaluzia e a Civilização Islâmica
A Andaluzia é a principal via da civilização muçulmana, a ponte mais importante através da qual a civilização islâmica se transferiu para a Europa e teve um impacto em várias áreas científicas, intelectuais, sociais e econômicas. A Andaluzia, que é parte da Europa, permaneceu por oito séculos (92-897 dH / 711-1492 dC) como um farol irradiante da civilização durante o tempo em que os muçulmanos estavam lá, mesmo quando era politicamente fraco, e quando os reinos dos partidos apareceram. Isso ocorreu através de suas universidades, escolas, bibliotecas, fábricas, palácios, jardins, cientistas e homens de letras.
A Andaluzia tornou-se ponto de atenção dos europeus, cujos países tinham contatos íntimos e contínuos com a Andaluzia. [Hani al-Mubarak e Shawqi Abu Khalil: Dawr hadarah al-al-al-Islamiyah Arabiyah fi al-Al Nahda urubiyah (Papel dos árabes, a civilização islâmica no renascimento europeu), pp 51,52.] Logo após os muçulmanos se estabelecerem na Espanha, eles se dedicaram ao conhecimento e concentraram sua atenção sobre as ciências, a literatura e as artes.
Nesse sentido, os muçulmanos superaram o progresso alcançado por seus irmãos no oriente, fizeram grandes inovações em todas as ciências, o que deu à Europa enormes fontes das quais continuou a assimilar o conhecimento desde o final do século XI até o renascimento italiano, no século XV. Gustav Le Bom disse: “Tão logo os árabes completaram a conquista da Espanha, eles começaram a cumprir a mensagem da civilização nela.
Em menos de um século, eles conseguiram dar vida a uma terra árida, reconstruir as cidades destruídas, instituir magníficos edifícios e fortalecer estreitas relações comerciais com outras nações. Eles então passaram a se dedicar ao estudo das ciências e artes e à tradução dos livros do grego e do latim, e fundaram as universidades que continuaram a ser um lugar para a cultura na Europa por muito tempo.” [Lebon Gustav: A civilização dos árabes p 273.]
A política de tolerância islâmica teve um grande impacto sobre a Ahl al-Zhimma (não-muçulmanos que vivem sob a proteção do Estado Muçulmano), incluindo judeus e cristãos. Os espanhóis arabizados tiveram interesse em estudar a língua árabe e a usaram em suas vidas cotidianas.
Eles até mesmo a preferiram em vez da língua latina. E muitos judeus estudaram nas mãos dos professores árabes. A tradução do árabe na Andaluzia prosperou muito, principalmente em Toledo, durante os séculos XII e XIII. A tradução costumava ser feita do árabe para o espanhol e, depois, para o latim, ou do árabe para o latim diretamente.
A tradução não ficou restrita aos livros escritos por cientistas árabes sobre todos os ramos do conhecimento, mas abrangeu grandes livros gregos que foram traduzidos no oriente dois séculos antes. Alguns livros de escritores gregos, como Galeno, Hipócrates, Platão, Aristóteles, Euclides e outros foram traduzidos. Um dos mais famosos tradutores de Toledo foi Gerard de Cremona, que é chamado de “o toledense”. Ele chegou da Itália, em 1150 dC, e lhe é atribuída a tradução de cerca de cem livros, entre eles: 21 de medicina, incluindo a Al-Mansuri, escrito por Al-Razi e al-Qanun (A lei) por Ibn Sina.
Alguns dos livros parecem ter sido traduzidos pelos seus alunos sob sua supervisão e alguns em colaboração com outros, principalmente “Galipus”, que era arabizado. Durante o século XII, a tradução também foi praticada por espanhóis e outros que vieram para a Espanha. Afonso X, o rei de Castela (1252-1284 dC) criou várias instituições de ensino superior e incentivou a tradução do árabe para o latim e, às vezes, para a língua castelhana. [Mahmud al-Jalili: Ta’thir al-tib Al-Arabi fi al-hadarah al- urubiyah (O impacto da medicina árabe na civilização européia)] Sarton disse: “Os muçulmanos, os gênios do Oriente, realizaram grandes conquistas na Idade Média.
Os livros mais valiosos, mais originais e mais ricos em conteúdo, foram escritos em árabe. A partir de meados do século VIII até o final do século XI, o árabe era a língua da ciência que elevava a raça humana, a tal ponto que qualquer pessoa que queria estar familiarizado com a cultura de sua época e com sua forma mais recente tinha que aprender a língua árabe, e muitos estrangeiros aprenderam o árabe.
Eu não creio que precisamos ressaltar os progressos científicos dos muçulmanos nas áreas de matemática, física, astronomia, química, botânica, geografia e medicina.” [Hassan Shamsi Basha: Hakaza kanu iauma kunna (assim eram quando éramos) p 8. Veja: Ahmad Ali Al-Mulla: Athar al-Ulama al-Muslimin fi al-hadarah al-urubiyah (Impacto dos estudiosos islâmicos na civilização européia) p 110, 111.] A Andaluzia foi, portanto, um importante centro da civilização islâmica e foi uma das rotas mais importantes, através da qual está civilização se transferiu para a Europa.
CRONOLOGIA BÁSICA DE AL-ANDALUZ
711: Tarik, oficial do governador do norte da África, Musa Ibn Nusayr, sai de Tanger chefiando um exército de 7.000 homens e desembarca em Gibraltar. A ocupação da península se completa em 5 anos.
718: Possível data da batalha de Covadonga, que assinala o começo da resistência Astúria.
720: As muralhas e a ponte romana, de Córdoba, são reconstruídas e é fundado o primeiro cemitério muçulmano.
756: Abdul Rahman I, o último omíada de Damasco, chega à península e ocupa Córdoba. Estabelece uma dinastia que governará a Andaluzia até 1031.
784: Começa a construção da Mesquita de Córdoba.
822: O sucessor de Al-Hakam I, Abdrahman II, traz um período de prosperidade à Andaluzia. Aumenta a Mesquita de Córdoba e são construídas outras em Jaén e Sevilha.
831: Fundação de Murcia.
844: Incursão dos normandos a Lisboa, Sevilha, Cádiz e Sidônia.
929: Abdrahman III se proclama Príncipe dos crentes e torna-se independente de Bagdá. Começa o califado de Córdoba.
936: Início da construção da cidade de Madinat al-Zahra.
955: Fundação de Almería.
961: Al-Hakam II, sucessor de Abdrahman III cria uma biblioteca de mais de 400 mil volumes.
997: Campanha contra Santiago de Compostela, a cargo de Almanzor.
1031: Com a queda da dinastia omíada, começam a surgir reinos independentes de taifas em toda Andaluzia.
1042: Começam as obras do Alcázar de Sevilla.
1062: Fundação de Marraquesh.
1064: Construção da Alcazaba, al-qasbah, recinto fortificado, de Málaga.
1081: Desterro de El Cid.
1085: Alfonso VI toma Toledo. O rei de Sevilha, al-Mutamid, pede ajuda aos almorávidas e junto a eles derrota os cristãos em Sagrajas.
1163: Sevilha, capital de al-Andaluz.
1184: Começa a construção da Giralda de Sevilla.
1195: As tropas almoadas de Yaqub vencem ao exército cristão de Alfonso VIII, de Castela, em Alarcos.
1198: Morre Ibn Rushd, mais conhecido como Averróes.
1212: Os exércitos aliados de Castela, Aragão e Navarra vencem aos almoadas na batalha de Navas de Tolosa.
1231: Al-Ahmar ibn Nasr, fundador da dinastía nazarí, é nomeado governador de Arjona, sua cidade natal, e pouco depois estenderá seu poder a Jaén e Guadiz.
1236: Córdoba rende-se a Fernando III, de Castela. Alguns anos mais tarde, cairiam Jaén e Arjona (1246), Sevilha (1248) e outras cidades de Andaluzia.
1237: Começa a construção de Alhambra, sob a orientação de al-Ahmar.
1314: Começam as obras do Generalife.
1482: Inicia-se a guerra de Granada. Bobadilha arrebata o trono a seu pai.
1487: Málaga se rende às forças cristãs.
1489: Baeza e Almería rendem-se pacificamente aos reis católicos.
1491: Bobadilha, último rei nasari, capitula ante os reis católicos e negocia a entrega de Granada em 25 de novembro.
1492: No dia 2 de janeiro, os reis católicos entram em Granada, o último reduto muçulmano na Europa.