Diáspora acelera avanço do Islam no Paraná

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por: MAURI KÖNIG

O atual fluxo migratório de muçulmanos vindos da Ásia e da África está reconfigurando a cultura e a economia de pequenas e médias cidades do Paraná, um estado historicamente multifacetado na composição étnico-cultural. Já são 24 os enclaves islâmicos, um fenômeno impulsionado nos últimos quatro anos pela diáspora oriunda de 18 países, por causa da fome ou de perseguições políticas. Em 20 cidades paranaenses os muçulmanos estão organizados ou se organizando em torno de uma mesquita, o templo religioso propriamente dito, ou de uma mussala.

A contínua chegada de muçulmanos propagou os locais sagrados para o Islam no Paraná. O número de espaços dedicados à devoção a Allah é uma forma de medir o crescimento e seu nível de organização. O estado é o segundo do Brasil em templos islâmicos depois de São Paulo, metade aberta nos últimos quatro anos. São 13 mesquitas e oito mussalas. A primeira mesquita paranaense, inaugurada em 1968 em Londrina, é a segunda mais antiga do país depois da de São Paulo, de 1952. Desde então, o número cresceu lentamente até a rápida expansão a partir de 2010.

Quantos?

Não se sabe ao certo quantos são os muçulmanos no Brasil. O Censo 2010 do IBGE registra 35 mil, mas entidades islâmicas falam em 1,5 milhão. Essa conta não bate desde 1500. Alguns historiadores mencionam a vinda dos muçulmanos Chuhabidin Bin Májid e Mussa Bin Sáte na expedição de Pedro Álvares Cabral, embora os livros de História ignorem o fato. A colonização do país deu início a migrações esparsas, com a vinda de muçulmanos portugueses e espanhóis, ou a chegada de muçulmanos negros trazidos como escravos (resultando na Revolta do Malês, em 1835, na Bahia).

No Paraná, os primeiros muçulmanos começaram a chegar na década de 1920, atraídos pelo libanês Hussein Ibrahim Omairi. Estabelecido primeiro em Ponta Grossa, ele viu em Curitiba melhores oportunidades e passou a chamar os parentes. O começo foi como mascate. Em 1957, fundaram uma sociedade beneficente como espaço recreativo e de apoio aos recém-chegados. Em 1972, inauguraram a mesquita. A comunidade islâmica de Curitiba tem hoje em torno de 5 mil membros, entre imigrantes e descendentes, segundo o diretor religioso da Sociedade Muçulmana Beneficente do Paraná, Gamal Omairi.

A atual migração muçulmana ao Paraná difere daquela iniciada na década de 1920 e intensificada a partir dos anos 50, dando origem às suas três maiores irmandades islâmicas, em Foz do Iguaçu, Londrina e Curitiba. Antes, vinham imigrantes sírios, libaneses e palestinos; hoje vêm muçulmanos da África, da Ásia e do Oriente Médio. Os de antes se dedicavam ao comércio varejista, os de agora seguem o lastro das oportunidades de emprego no abate halal de aves e bovinos. Há por trás desse fenômeno um caráter econômico que tem moldado a expansão do Islam no Brasil.

Método halal

Maior exportador mundial de carne de frango, o país abateu 5,6 bilhões de aves em 2013 e exportou 1,8 milhão de toneladas de aves abatidas pelo método halal. Outras 318 mil toneladas de carne bovina renderam US$ 4 bilhões em vendas a países árabes. O Paraná é o maior produtor do país e o primeiro em exportação de frangos, líder também no abate halal, com US$ 2 bilhões em vendas externas em 2013. Como o abate segundo os rituais islâmicos só pode ser feito por muçulmanos, eles estão cada vez mais presentes nas cidades cuja avicultura é o motor econômico.

Chegam fugindo da fome ou de perseguições políticas em países como Bangladesh, Afeganistão, Paquistão, Angola, Moçambique, Palestina, Iraque, Jordânia, Índia, Síria, Gana, Líbano, Guiné, Senegal, Egito, Congo, Somália e do território da Caxemira. O perfil do novo imigrante islâmico dinamiza a economia e a cultura no interior paranaense, com a instalação de um núcleo ainda que pequeno onde há o abate halal. Unidos pela crença comum e pelo local de trabalho, esse núcleo tende a estabelecer uma comunidade.

Quando atinge um melhor grau de organização, essa comunidade costuma se tornar uma congregação, reunindo-se em um local de oração coletiva, que pode ser uma sala, uma mussala ou mesquita. Se o nível de organização aumenta, estão dadas as condições para a constituição de uma associação ou entidade beneficente muçulmana na comunidade, pontua Eonio Cunha, colaborador do Instituto Brasileiro de Estudos Islâmicos. “E para o uso de ferramentas digitais visando à difusão do Islam, como Facebook, blogs e sites na internet”, salienta.

Uma verdadeira conquista para o Oeste

As exportações de carne para o Oriente Médio têm determinado os rumos dos novos imigrantes muçulmanos no Brasil. A maioria chega por São Paulo ou Brasília, onde legalizam a permanência. Depois, ao buscar trabalho acabam parando nos frigoríficos, que têm motivos de sobra para contratar esses imigrantes. Apenas no ano passado foram exportadas 318 mil toneladas de carne bovina e 1,8 milhão de tonelada de aves abatidas pelo método halal, que só pode ser feito por muçulmanos.

“O Paraná é o estado com maior número de frigoríficos e todos têm o abate halal. Daí terem vindo mais muçulmanos para essa região”, diz Muhammad Imran, supervisor desse tipo de abate pela certificadora Siil Halal no frigorífico da Copagril em Marechal Cândido Rondon, na Região Oeste. O estado tem hoje 24 cidades que atendem às exigências do islam para a degola de animais destinados às exportações. Em 20 delas a comunidade muçulmana já está organizada ou está se organizando em torno de uma mussala ou uma mesquita, a exemplo de Francisco Beltrão, no Sudoeste, e de Jaguapitã, no Norte.

Em Francisco Beltrão, de 85 mil habitantes, a mesquita foi inaugurada em março de 2014. A comunidade islâmica é formada por 70 pessoas, a maioria empregada no abate . São oriundos de Bangladesh, Paquistão, Marrocos e Somália. Também há alguns árabes e brasileiros convertidos ao Islam. Em Jaguapitã, cidade de 12 mil habitantes, a mesquita foi aberta em outubro de 2013. A maioria é de bengalis e grande parte trabalha no abate halal nos frigoríficos das avícolas Avebom e Jaguafrangos.

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fonte: www.gazetadopovo.com.br

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